Na prática clínica, é comum que profissionais de saúde se sintam inseguros ao atender pessoas autistas que não utilizam a linguagem oral. Essa insegurança muitas vezes decorre da falta de formação específica sobre comunicação alternativa e da falsa suposição de que a ausência da fala impede a interação significativa. Na realidade, pessoas autistas não verbais possuem formas legítimas e diversas de se comunicar, e o papel do profissional é adaptar sua escuta, seus recursos e seu ambiente para promover um atendimento ético, funcional e humanizado.
Cerca de 25% a 30% das pessoas com diagnóstico de TEA são não verbais ou têm fala extremamente limitada. Isso, no entanto, não significa que não compreendam o que está sendo dito ou que não tenham o que expressar. Muitos utilizam gestos, expressões faciais, sistemas de comunicação alternativa (como PECS ou aplicativos) ou até mesmo o comportamento como forma de expressar necessidades, emoções e preferências. Quando essas formas não são compreendidas ou respeitadas, gera-se frustração, sofrimento e, muitas vezes, retração diante da relação clínica.
A inexistência de meios funcionais de comunicação está entre os principais fatores associados ao surgimento e à manutenção de comportamentos desafiadores em pessoas autistas. Agressividade, autoagressão, crises de choro, fuga ou resistência a procedimentos muitas vezes são tentativas de comunicação de dor, medo, desconforto sensorial ou simples recusa. Quando o profissional compreende essa relação, passa a enxergar esses comportamentos não como problemas isolados, mas como sinais de que a comunicação precisa ser ampliada e adaptada. Oferecer alternativas comunicacionais reduz drasticamente esses episódios e melhora a qualidade do vínculo terapêutico.
A comunicação é a ponte entre o cuidado técnico e o acolhimento humano. Ao expandir sua compreensão sobre linguagem, você não só amplia seu repertório clínico, mas rompe barreiras de exclusão que historicamente silenciaram pessoas autistas não verbais.
Quantos pacientes já foram rotulados como “difíceis” simplesmente porque não se comunicavam como o esperado? Quantas oportunidades de conexão foram perdidas por falta de preparo do profissional?
Estar preparado para atender uma pessoa autista não verbal não é um dom — é um compromisso ético que exige estudo, escuta e atualização constante. Você está disposto a percorrer esse caminho? Aprender a ouvir sem palavras é uma das formas mais profundas de respeito que a clínica pode oferecer.