Avaliação precoce do autismo: ferramentas e sinais de alerta para profissionais da saúde

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento que impacta de maneira significativa as esferas da comunicação, socialização e comportamento. O diagnóstico e a intervenção precoces são considerados pilares fundamentais para ampliar o potencial de desenvolvimento de crianças com TEA, garantindo melhores resultados terapêuticos, acadêmicos e sociais ao longo da vida.

Nesse contexto, os profissionais da saúde ocupam uma posição estratégica: são frequentemente os primeiros a ter contato com sinais atípicos no desenvolvimento infantil. Sua escuta atenta, conhecimento técnico e capacidade de encaminhamento qualificado são determinantes para evitar atrasos na identificação e intervenção do TEA. Este artigo apresenta os principais sinais de alerta, as ferramentas mais utilizadas na triagem e avaliação precoce, e destaca o papel ativo que psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, pediatras, fisioterapeutas e demais especialistas devem assumir frente a esse cenário.

A importância da detecção precoce no TEA

Diversos estudos evidenciam que a intervenção nos primeiros anos de vida está associada a melhorias expressivas na comunicação funcional, no repertório social e na redução de comportamentos desafiadores. Além disso, iniciar o acompanhamento precoce contribui para maior adaptação familiar, redução da ansiedade dos cuidadores e melhora da qualidade de vida da criança.

Entretanto, dados epidemiológicos revelam que, mesmo quando há sinais visíveis já nos primeiros anos de vida, muitas crianças ainda recebem o diagnóstico formal tardiamente — muitas vezes, após os 4 anos de idade. Entre os fatores que contribuem para esse atraso estão a falta de conhecimento técnico dos profissionais de atenção primária, mitos sobre o desenvolvimento infantil e o receio em abordar o tema com as famílias.

Sinais de alerta: o que observar nos primeiros anos

É essencial que os profissionais da saúde estejam capacitados para diferenciar variações do desenvolvimento típico de sinais que podem indicar risco para TEA. Abaixo, destacam-se alguns marcos importantes:

Até 12 meses:

  • Pouca ou nenhuma resposta ao nome;
  • Contato visual escasso;
  • Pouco interesse por rostos ou interações sociais;
  • Ausência de sorrisos sociais.

Entre 12 e 24 meses:

  • Ausência de gestos como apontar, mostrar, acenar ou compartilhar interesses;
  • Dificuldade em imitar ações simples;
  • Atraso ou ausência de balbucio ou fala funcional;
  • Reações exageradas ou indiferentes a estímulos sensoriais.

A partir dos 24 meses:

  • Brincadeiras repetitivas e restritas;
  • Dificuldade de engajamento em jogos simbólicos (faz de conta);
  • Resistência a mudanças de rotina;
  • Comportamentos estereotipados (como girar objetos ou agitar as mãos).

Estes sinais não significam, isoladamente, um diagnóstico de TEA, mas indicam a necessidade de encaminhamento para avaliação especializada.

Principais ferramentas para triagem e avaliação diagnóstica

A aplicação de instrumentos padronizados é fundamental para auxiliar na identificação precoce do risco para TEA e nortear a tomada de decisão clínica. Dentre os principais recursos utilizados, destacam-se:

  • M-CHAT-R/F (Modified Checklist for Autism in Toddlers – Revised with Follow-Up): instrumento de triagem recomendado para crianças entre 16 e 30 meses. Consiste em um questionário simples que pode ser aplicado por profissionais da atenção primária. Identifica sinais precoces de risco e indica a necessidade de avaliação mais detalhada.
  • CARS (Childhood Autism Rating Scale): escala observacional composta por itens que avaliam comportamentos característicos do autismo em diferentes domínios, como relacionamento interpessoal, linguagem verbal e não verbal, respostas emocionais e uso de objetos. É amplamente utilizada na prática clínica para auxiliar no diagnóstico e graduação da gravidade dos sintomas.
  • ADOS-2 (Autism Diagnostic Observation Schedule – Second Edition): instrumento de avaliação observacional estruturado, considerado padrão-ouro para o diagnóstico do TEA. Abrange diferentes faixas etárias e níveis de desenvolvimento, permitindo a coleta sistemática de dados comportamentais relevantes.

O uso dessas ferramentas deve ser realizado por profissionais devidamente treinados e sempre integrado a uma avaliação clínica completa, com base em critérios estabelecidos por manuais diagnósticos como o DSM-5.

O papel do profissional da saúde na linha de cuidado do TEA

Além de identificar e aplicar instrumentos de triagem, cabe ao profissional da saúde:

  • Acolher escutas e inquietações familiares com empatia e sem julgamento;
  • Promover orientações claras sobre os próximos passos do processo diagnóstico;
  • Estimular práticas colaborativas e encaminhamentos interdisciplinares;
  • Registrar cuidadosamente as observações e hipóteses clínicas;
  • Estar atualizado quanto às diretrizes e práticas baseadas em evidências.

É importante lembrar que o diagnóstico é apenas o início de uma jornada de cuidado, e que o envolvimento sensível e informado do profissional pode fazer toda a diferença para o bem-estar da criança e sua família.

Considerações importantes!

O compromisso com a detecção precoce do autismo não é apenas uma questão técnica — é uma escolha ética, social e humana. Cada criança que tem seus sinais reconhecidos a tempo representa uma história que pode ser transformada, um potencial que pode ser expandido, uma família que se sente amparada.

Profissionais da saúde são agentes de mudança. E, em meio aos desafios cotidianos, sua escuta, seu olhar atento e sua decisão de agir com responsabilidade têm o poder de romper ciclos de silêncio e atraso no cuidado.

Seja você o início da mudança. Busque formação contínua, compartilhe conhecimento com sua equipe e não hesite em agir diante dos primeiros sinais. A infância não espera. E o seu papel é essencial para garantir um futuro mais inclusivo, justo e acolhedor para todas as crianças.

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